domingo, 4 de novembro de 2012

A morte das línguas


A morte das línguas
Vimos um exemplo de um fenômeno comum: uma língua (como o latim),
quando se espalha por uma grande região geográfica (como a Europa), acaba com o tempo desdobrando-se em novas línguas que não existiam antes (como o francês, o espanhol, o italiano). Esse é um dos processos de formação de novas línguas. Mas podemos imaginar que, para cada língua que "nasceu" na Europa a partir do latim, dezenas de línguas "morreram". As pessoas que antes falavam outras línguas, acabaram falando uma forma do latim que hoje chamamos espanhol, francês, português, etc. Por exemplo, no tempo do império romano, toda a região do oeste da Europa (norte da Itália, Suíça, parte da Alemanha, França, Bélgica) era chamada Gália pelos romanos. Nessa região, falavam-se várias línguas celtas. Os gauleses resistiram à invasão romana (lembrem-se das aventuras do Asterix!), mas no fim foram dominados, e todas as línguas celtas que eles falavam desapareceram.
 Todas as estimativas de população são apenas aproximadas, porque a população mundial está crescendo muito rapidamente! Quando eu estava no colégio (1960), a população mundial era de 3 bilhões. No ano 2000, já tinha dobrado para 6 bilhões. Nos últimos sete anos, cresceu mais 700 milhões! As estimativas do número de falantes das línguas variam muito e dependem de vários fatores, como: quando a estimativa foi feita, quais variedades de cada língua foram consideradas, se inclui ou não falantes da língua como segunda língua, etc. A mesma coisa aconteceu nas Ilhas Britânicas, quando foram invadidas pelas tribos germânicas a partir do século V. Os povos germânicos massacraram e afugentaram os povos celtas que habitavam a ilha. A língua que resultou da invasão e conquista foi a língua inglesa (uma língua germânica), mas a custo da perda das línguas celtas indígenas da ilha. Hoje só restam línguas celtas nas margens da Inglaterra, no norte da Escócia, na Irlanda e no País de Gales. A parte ocidental (ao oeste) da península ibérica também foi colonizada por gauleses, povos de língua celta. É por isso que Portugal se chama porto-gal (porto gaulês), e que a língua falada na parte da Espanha que fica bem ao norte de Portugal se chama galego. Mas o português e o galego são línguas românicas, e não línguas celtas. As línguas dos antigos povos celtas desapareceram. Então vimos que algumas línguas crescem a custo de outras. As pessoas, numa região em que duas ou mais línguas são usadas, muitas vezes acabam optando pela língua que tem mais prestígio, que é usada pelo poder, e que pode trazer mais benefícios. Quando deixam de usar uma língua, e quando os últimos falantes daquela língua morrem, a língua também morre. Se a língua é escrita, ainda podemos saber algo sobre ela, mas a maioria das línguas não tem escrita e, quando morrem, desaparecem para sempre.
A morte de línguas continua acontecendo. Alguns lingüistas estimam que, nos próximos 50 anos, 50% das línguas que existem hoje – 3500 dos quase 7000 línguas – vão morrer. O Ethnologue lista 516 línguas no mundo já quase extintas. A maioria delas tem menos de 50 falantes. Veja a lista de línguas quase extintas para ver o número de pessoas que ainda falam essas línguas.
Repare quantas línguas brasileiras estão nessa lista! Lingüistas no Brasil
 incluem até mais línguas brasileiras ameaçadas de morte. As línguas de sinais do mundo não são exceções. Um artigo recente traz estatísticas que mostram que a população de surdos natos na Austrália está diminuindo.8 Com o controle genético, com o melhor controle da rubéola, com o implante coclear e com a política da inclusão, entre outros fatores, a comunidade surda australiana pode diminuir a ponto de ser difícil manter a língua de sinais australiana, dentro de algumas décadas. Alguns celtas que escaparam dos invasores germânicos fugiram para o oeste da França, onde ainda existe o bretão, outra língua celta que sobreviveu.

Ver, por exemplo, <http://www.ethnologue.com/nearly_extinct.asp>.
8Trevor Johnston, W(h)ither the deaf community: Population, genetics, and the future of
Australian Sign Language, Sign Language Studies, v. 6, n. 2, 2006.
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 Fonte: Curso de Licenciatura em Letras-Libras
2007 - UFSC

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